segunda-feira, 21 de julho de 2008

JPC

Gosto muito das crónicas do João Pereira Coutinho. Gosto da sua crítica esclarecida e inusitada, gosto do seu sentido de humor mordaz e adoro a clareza com que se auto-analisa, parodiando os seus defeitos e experiências ao serviço de uma arte maior - o nosso entretenimento. Gosto tanto dele, melhor, da sua escrita, que até lhe perdoo os momentos narcisistas presentes nos parênteses indicando os muito livros lidos. Quando me apercebo que partilho gostos de leitura com alguém que admiro pela sua inteligência - Philip Roth, Philip Larkin, George Steiner - fico com a sensação breve mas agradável que sou um bocadinho mais inteligente do que pensava. Um engano momentâneo não faz mal a ninguém.
Retirei do seu livro de crónicas, Avenida Paulista, um excerto que apaziguou esta minha personalidade sequiosa, permanentemente insatisfeita e carente. Não me trouxe certezas pacíficas, apenas me trouxe o conforto de me saber acompanhada de outros náufragos num mar de incertezas momentâneas.
"O casamento segundo Sondheim"
Company não é um musical sobre adultos. É sobretudo um musical para adultos, sem que o patético sentimentalismo romântico se introduza nos versos, pronto para distorcer a verdade última da nossa condição: sim, existem vários motivos para não estarmos com alguém; mas talvez não exista nenhum para estarmos sozinhos. (...) Para quê deixar entrar na nossa vida alguém disposto a sentar-se na nossa cadeira, a arruinar o nosso sono, a conhecer-nos profundamente e, quem sabe, a magoar-nos profundamente? Porque estar só é estar só, não é estar vivo. E se o leitor ainda tiver dúvidas sobre o casamento depois de ver e ouvir Company, não desespere: talvez esse seja o estado natural. Com a certeza de que a pessoa que ama terá as mesmas dúvidas. E com dúvidas ficará ao seu lado.

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