De quando em vez somos invadidos por patifes e intrusos, comummente apelidados de bactérias e vírus, que nos obrigam a recorrer ao médico de família e a entrar num espaço estranho e hostil chamado Centro de Saúde. Onde vivo não se chama Centro, talvez porque se encontre na zona mais recôndita da aldeia, mas sim Posto Médico.
Eu não gosto lá muito de ir ao Posto Médico. É o local por excelência onde se coloca a conversa em dia, a "praça da alegria" das beatas e hipocondríacos residentes. Tem o seu fascínio quando encontramos pessoas que não nos veêm há anos (até tenho medo de usar números) "Ah, tu é que és a filha da ...?" "Nã te fazia aqui. Tás tãm mudada. Qu'ingraçado. És a cara do tê pai." (Vá lá, tenho os peitinhos da mamã.) Grave é quando se especula sobre a doença de cada palerma que espera infinitamente pela Sô Dôtora, incluindo eu. Das últimas vezes que lá tenho ido, encontro caras e olhos que me perscrutam com o olhar à procura de um diagnóstico plausível. Para as beatas, gravidez é que tinha piada. Sempre lhes animava o dia com uma novidade para espalhar por aí.
Para além disso, há sempre os que penosamente anseiam pela Ceifeira para acabar com aquelas dores, ao passo que outros, velhotes persistentes, com um dente orgulhosamente só estampado no sorriso, esforçam-se por protelar tão indesejada ida. A senhora que esteve ao meu lado, durante grande parte da espera, fazia parte desse grupo. Enrolada num preto eterno e sofrível, com o lenço a tapar o cabelo rarefeito e com um intenso cheiro a naftalina... como se estivesse esquecida num quarto húmido e bolorento, à espera que a levassem para avaliar a resistência dos corpo ao abandono a que foi votada.
No Posto Médico da minha aldeia falam todos muito alto e interrogam-se sobre o tempo que demoram as consultas "Isso é que foi, hein, uma cúnsulta dos péis à cabeça. A médca mandô-t tomar muitos reméidos?" - aparentemente, são todos médicos por natureza. Deve ser do tempo livre que têm para diagnosticar as maleitas alheias. A médica fica furiosa e grita lá do gabinete "Vamos a fazer silêncio!". E depois mandam-se todos calar uns aos outros. Durante 5 minutos. Por que a espera é longa e o local propicia a tagarelice. É melhor aproveitar o tempo que nos resta. Afinal, amanhã podemos estar todos mortos, néi?
P.S- O sotaque em questão é o saloiês. Um dia destes faço aqui uma lista de termos saloios para a posteridade. A minha avó não se importa de ser a minha cobaia.
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